João César Monteiro
João César Monteiro das Neves (Figueira da Foz, 2 de Fevereiro de 1939 — Lisboa, 3 de Fevereiro de 2003) foi um cineasta português. Integrou o grupo de jovens realizadores que se lançaram no movimento do Novo Cinema. Irreverente e imprevisível, fez-se notar como crítico mordaz de cinema nos anos sessenta.
Segue um percurso original que lhe facilita o reconhecimento internacional. Várias das suas obras são representadas e premiadas em festivais internacionais como o Festival de Cannes e o Festival de Veneza (Leão de Prata: Recordações da Casa Amarela).
Biografia
É dos poucos cineastas associados ao movimento do novo cinema que não prossegue estudos universitários. A propósito, o seu alter-ego, no filme Fragmentos de um Filme Esmola (1973), explica-se assim: «A escola é a retrete cultural do opressor».
Começa a trabalhar como assistente de realização de Perdigão Queiroga. Em 1963, graças a uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, vai para a Grã-Bretanha estudar na London School of Film Technique. De volta a Portugal, em 1965, inicia a rodagem do que viria a ser a sua primeira obra: Quem espera por sapatos de defunto morre descalço. O filme só será concluído cinco anos depois, como média-metragem.
A sua obra, polémica e dificilmente classificável, caracteriza-se pelo lirismo, em forma de filmes-poema. A sua veia satírica como realizador tem sido objecto de estudo para portugueses e estrangeiros, críticos e académicos. João César Monteiro, que tem sérios detractores, é conhecido como um dos mais importantes realizadores portugueses.
Filmografia
Longas-metragens
Que Farei Eu com Esta Espada? (1975)
Veredas (1978)
Silvestre (1982)
À Flor do Mar (1986)
Recordações da Casa Amarela (1989)
O Último Mergulho (1992)
A Comédia de Deus (1995)
Le Bassin de John Wayne (1997)
As Bodas de Deus (1999)
Branca de Neve (2000)
Vai e Vem (2003)
Curtas e médias-metragens
Sophia de Mello Breyner Andresen (filme) - 1972
Amor de Mãe (1975)
O Amor das Três Romãs (1979)
Os Dois Soldados (1979)
O Rico e o Pobre (1979)
O Bestiário (1995)
Lettera Amorosa (1995)
Passeio com Johnny Guitar (1995)
Como produtor
O Amor das Três Romãs (1979)
À Flor do Mar (1986)
Como actor
As Bodas de Deus (1999)
Le Bassin de J.W. (1997)
A Comédia de Deus (1995)
O Bestiário ou o Cortejo de Orpheu (1995)
Lettera Amorosa (1995)
Passeio com Johnny Guitar (1995)
Rosa Negra, de Margarida Gil (1992)
Paroles, de Anne Benhaïem (1992)
Conserva Acabada (1990)
Recordações da Casa Amarela (1989)
Relação Fiel e Verdadeira, de Margarida Gil (1989)
Doc's Kingdom, de Robert Kramer (1987)
À Flor do Mar (1986)
A Estrangeira, de João Mário Grilo (1983)
Amor de Perdição, de Manoel de Oliveira (1979)
Livros
Morituri te Salutant (1974)
Le Bassin de John Wayne (1998)
As Bodas de Deus (1998)
Uma Semana Noutra Cidade (1999)
João César Monteiro iniciou-se no cinema em 1961 como assistente de produção de Perdigão Queiroga no fime O Milionário. Dois anos depois rumou a Londres com uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian para frequentar a London School of Film Technique. Regressado a Portugal realiza filmes publicitários e dedica-se à crítica cinematográfica.
Quem Espera por Sapatos de Defunto Morre Descalço (1970) é uma curta- metragem sobre jovens intelectuais na Lisboa do princípio da década, seguindo-se-lhe o primeiro filme de fundo: Fragmentos de um Filme-Esmola: A Sagrada Família (1973), um dos projectos emanados do Centro Português de Cinema, organismo criado por cineastas do chamado "cinema novo" e subsidiado pela Fundação Calouste Gulbenkian. Nele se revelam já algumas das coordenadas da obra futura de João César Monteiro, nomeadamente um pendor literário algo surrealizante: o filme tem como base textos de autores tão díspares como Ésquilo, James Joyce, Francis Ponge e André Breton.
Um ano depois da Revolução de 25 de Abril de 1974 realiza a longa-metragem Que Farei Eu com esta Espada?, que, embora eivada de referências à situação política então vivida, se distingue de filmes contemporâneos pela carga simbólica (surge mesmo Nosferatu, o vampiro de Murnau) de que faz rodear imagens de manifestações e de certa marginalidade lisboeta.
Com Veredas (1977) inicia uma fase de abordagem de lendas e contos da mitologia popular portuguesa, a que dará sequência numa série da Rádio Televisão Portuguesa, intitulada precisamente "Contos Tradicionais Portugueses" (1979), para a qual roda O Amor das Três Romãs, Os Dois Soldados e O Rico e o Pobre. Silvestre (1982) é ainda a adaptação dum conto tradicional, ambientado no séc. XV, e marca a estreia em cinema da que se viria a tornar uma das mais internacionais actrizes portuguesas: Maria de Medeiros.
O próprio João César Monteiro começa a ganhar alguma projecção internacional, o que se reflecte na presença dum elenco internacional (encabeçado por Laura Morante) no seu filme seguinte, À Flor do Mar (1986).
O maior destaque internacional de João César Monteiro surgirá com Recordações da Casa Amarela (1989), vencedor do Leão de Prata do Festival de Veneza, em que faz nascer no écran a figura de João de Deus, seu alter-ego, que marcará presença em futuros filmes. Não o retomará em O Último Mergulho (1991), que filma para a série "Os Quatro Elementos" da RTP, nem nas curtas-metragens O bestiário e Lettera Amorosa, ambas de 1995, mas fá-lo-á reaparecer em dois outros trabalhos de 1995: a curta-metragem Passeio com Johnny Guitar e A Comédia de Deus. O seu estilo vai-se tornando cada vez mais abstracto, com planos largos e frequentemente insólitos e um erotismo usado de forma provocadora.
São estas também as características de Le Bassin de John Wayne (1997) e As Bodas de Deus (1999), pelos quais perpassa uma crítica corrosiva ao modelo da sociedade ocidental, baseado na luta pelo poder e pelo dinheiro.
No ano 2000 filma o que será o seu filme mais polémico, Branca de Neve, que, aquando a estreia, reacenderá o debate sobre a atribuição de subsídios a obras cinematográficas que atraem poucos espectadores. No caso de Branca de Neve, a controvérsia era sobretudo motivado pelo facto de durante mais de metade do filme o écran estar a negro, ouvindo-se apenas as vozes de actores narrando a história, opção justificada pelo realizador pelo facto de as crianças a conhecerem essencialmente contada e não visualizada. João César Monteiro insurgia-se também contra a dependência dos espectadores portugueses de modelos narrativos convencionais, derivados duma estética televisiva que nada tinha a ver, na sua concepção, com a criatividade que devia exigir-se do cinema.
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